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Aramis

A travessia pelo talento de Bituca em cinco fases

Por várias razões - mas que podem ser resumidas na questão econômica, que desistimula investimentos maiores em áreas de riscos - a maioria das gravadoras vem fazendo relançamentos às mãos-cheias. Desde as multinacionais com seus acervos históricos até pequenas etiquetas, com público específico - como a Revivendo, do bravo Leon Barg, em Curitiba, já com mais de 60 títulos na praça e preparando-se para os três primeiros Cds (Carmem Miranda, Orlando Silva e Francisco Alves). No Rio, a Filigramas, Motodiscos e até a Collector's (esta na base dos cassetes) também disputam esta faixa de consumidores nostálgicos acima dos 40 anos. Mas há opções para todas as idades. As multinacionais, obviamente, atacam nas três frentes: disco convencional, fitas e mesmo Cds. É o que faz a Emi-Odeon com a bela homenagem a João Gilberto, reeditanto seus três elepês (1960/62), que após saírem em edição convencional estão chegando em laser - para a alegria de quem sabe reconhecê-lo como o mais importante divisor de águas na MPB. Da mesma Emi-Odeon que teve Milton Nascimento por contrato por quase 20 anos (agora ele está na CBS com novo álbum - o ecológico "Txai", setembro/90), sai um dos mais interessantes álbuns do ano, que reúne a síntese de sua obra em cinco discos numa caixa ("Travessia"), que mostram a importância deste compostitor/intérprete, que chegou aos 48 anos no último dia 26 de outubro. Como diz o jornalista Castilho de Andrade ("Jornal da Tarde", 8/9/90), Milton é tão bom que acabou enjoando. Seus discos, curiosamente, nem criam grande expectativa. Já se sabe de antemão que só pode ser coisa boa. "Txai" resgata, como nunca se fez, a tradição musical dos povos indígenas do Brasil. Milton sempre cantou bem, com um raro timbre de voz, e suas composições dispensam adjetivos. os princípios de Milton são universais: a defesa da ecologia, o combate à tortura e repressão, o respeito aos índios, a valorização da cultura latino-americana, a negritude, toda forma de amor, a democracia, as montanhas de Minas e, especialmente, o enaltecimento da amizade. Tudo isto está nas 60 faixas, de gravações em diferentes épocas, diferentes parceiros, e também formações musicais variando algumas vezes - mas basicamente fiéis ao espírito do Clube da Esquina. Para quem já possui as gravações originais - mas lamenta que as mesmas estejam desgastadas de tanto serem escutadas - eis a oportunidade de se ter, de uma vez só, numa bela embalagem, uma antologia de sua carreira, num belo envólucro e acompanhado com uma brochura com as letras das músicas sobre desenhos de capas de discos antigos de Milton. Naturalmente, a primeira música do disco um é "Travessia", que chegou internacionalmente nas vozes de Sarah Vaughan e Sinatra entre outros. Mas é na voz de seu dono que se tem toda a beleza desta música que Milton teve reconhecida em outubro de 1967, ao participar da fase nacional do FIC-RJ, no qual também classificaria "Morro Velho" - que, aliás, ficou fora desta antologia. São tantas que é difícil destacar as participações especiais, mas não se pode esquecer a maravilhosa Alaíde Costa (que encerra hoje a temporada de "Cantoria", ao lado de Hermínio Bello de Carvalho e Dalva Torres, no auditório Antônio Carlos Kraide, no Centro Cultural do Portão) em "Me Deixa em Paz". Também presentes emotivamente Marcos Vialle ("Viola Enluarada"), Beto Guedes e Lô Borges mais o Som Imaginário em "Nada Será Como Antes", "Cravo e Canela", "Fé Cega, Faca Amolada" e "Violar"; Clementina de Jesus em "Circo Marimbondo"; Chico Buarque ("Cancion por la Unidad Latino-Americana" e "O Que Será"); Mercedes Sosa ("Volver a los 17") e Elis Regina ("O Que Foi Feito de Vera"). Um álbum documento notável. Nem poderia ser diferente.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
6
04/11/1990

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