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Aramis

Um "Rei da Comédia" de pouco riso, muito siso

O Jerry Lewis que o espectador vê em "O Rei da Com´dia" é um senhor gordo, sério, mau humorado o tempo todo - o oposto da imagem brincalhona e até um tanto retardada do comediante que desde 1949, em dupla com Dean Martins e, a partir de 1957 ("O Deliqüente Delicado") faria uma carreira solo - passando a partir de 1961 a dirigir suas próprias comédias. Roberto de Niro, que interpreta o obcecado candidato a comediante Rupert Pupkin, é quase irreconhecível - depois de ter sido premiado com o Oscar de melhor coadjuvante ("O Poderoso Chefão", 1974) e de três filmes com Martin Scorcese: "Taxi Driver" (1976), "New York, New York" (1977) e, espcialmente, "O Touro Indomável" (1979), pelo qual ganhou o Oscar de melhor ator. Martin Scorcese declarou que "The King of Comedy" (Cine Groff, 5 sessões) pode ser um filme muito engraçado, mas está longe de ser uma comédia" Realmente, não há nesta fita indicada pelos críticos do "The New York Times" como uma das melhores do ano passado, motivos para o público gargalhar. Ao contrário, há um certo clima de sufoco, que sem chegar ao suspense de "O Fan", coloca em questão a questão do "reconhecimento" e "transferência" que algumas pessoas passam a fazer nos seus ídolos. Se no filme de Edward Bianchi, a atriz Sally Ross (Lauren Bacall), uma veterana atriz de teatro, passa a ser ameaçada por um neurótico admirador, Douglas Breen (Michael Biehn), chegando a um final dramático, neste curiosos exercício de Scorcese, Lewis é Jerry Langford, famoso comediante e apresentador de um programa de televisão visto em cadeia nacional, que assediado por um canditado a um lugar ao sol artístico - Rupert Pupkin (De Niro), o ignora, provocando-o ao ponto deste e uma outra fã obcecada, Rita (Diahnne Abbott), o seqüestrarem. Scorcese explicando seu filme disse: "O enredo aborda o cômico de uma forma que deixa clara a necessidade que todos nós temos de sermos reconhecidos (...) Histórias de cômicos estiveram perto do meu coração durante anos e há muito planejava um filme sobre o assunto". Cineasta voltado a realidade americana, dos deserdados pela sorte, de outra América - os pequenos marginais de "Mean Streets", o chofer de táxi que se torna neurótico pela violência nas ruas de Nova iorque em "Taxi Driver", a decadência de um campeão de boxe em "Ranging Bull", Scorcese jamais pretendeu fazer uma comédia, pura e simplesmente em "The King of Comedy". Ao contrário, é amargo ao mostrar as limitações para um "João Ninguém" deixar o anonimato e obter sua primeira oportunidade. Rupert Pupkin - cujo nome é, invariavelmente, confundido por todas as pessoas - é um entre tantos rostos anônimos da multidão solitária que buscam uma oportunidade na vida. Scorcese diz: "Os valores podem se estender a todo mundo. São eles que nos dão objetivos errados ou corretos. Quem não tem ambição? E é ela que nos dá a medida de como anda o inter-relacionamento entre fantasia e realidade". Assim, colocando, ironicamente,um símbolo do humor tipicamente norte-americano - Jerry Lewis, que na década de 60 foi elevado às alturas de gênio pelos críticos do "Cahiers du Cinema" - como um ídolo de televisão, em contraposição a um humorista amador, angustiado em busca de sucesso, Scorcese constrói um filme denso e profundo sobre a ambição pessoal, a luta do humilde na sociedade competitiva e capitalista. Sem demagogia - mas também sem fugir da realidade - "O Rei da Comédia " é uma obra inquietante - ironicamenrte amarga, quando tudo sugere a simples entretenimento. Um Lewis que não faz rir, um Robert De Niro diverso daquele que o público se habituou a conhecer e um elenco de apoio com novos intérpretes - começando por duas expressivas atrizes - Diahnne Abbot e Sandra Bernhardt, mais participações especiais de nomes famosos da TV americana - o band-leader Low Brown, o tv-man Ed Herlihy, o ator Tony Randall (astro favorito de Frank Tashlin, que dirigiu as melhores comédias de Lewis) e até a filha de Martin, Catherine Scorcese, numa ponta. Especial atenção para a trilha sonora produzida por Robert F. Colesberrey, com uma colagem de várias e significativas canções - o que nos faz lamentar que mesma esteja inédita no Brasil. Um filme de pouso riso e muito siso, este "O Rei da Comédia"!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Tablóide
25/01/1984

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