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Aramis

Uma noite de amigos e belíssimas canções

Se não houvesse problemas de direitos autorais, "Grandes Músicos, Grandes Amigos" poderia se transformar num histórico CD, vídeo ou especial para televisão. Pois embora tenham ocorrido algumas falhas técnicas - o som, por exemplo, estava inaudível quando Johnny Alf subiu ao palco e fez o primeiro número, melhorando quando apresentou sua nova descoberta (a bela jovem paulista, Sandra Pereira, cantando "Ilusão à Toa") - a emoção, o astral e o significado do evento o tornou um momento muito especial. Doris Monteiro, 56 anos, que com Lúcio dividiu o Projeto Pixinguinha (e um elepê), abriu praticamente o show, seguida de solos brilhantes do violonista Sebastião Tapajós, com um delirante arranjo da cantiga de roda "O Cravo Brigou com a Rosa". Depois de Johnny Alf, foi o paulista Tito Madi, 61, que com seu romantismo ("Mentira", "Chove lá Fora") provou que continua na melhor forma. Agnaldo Timóteo contou pontos: além de mostrar toda sua inegável voz, fez ainda uma espécie de pronunciamento político em defesa do artista brasileiro, dentro de um astral positivo. E a seguir, vejam quem entrou! Antônio Carlos Jobim ao piano, seu filho Paulinho no violão e Jacques Morelembaum. Inicialmente, tendo José Renato, com sua voz perfeita, interpretando "Amor em Paz", depois com Paula Morelembaum em "Insensatez". Apesar de cada artista ter um tempo fixado para se apresentar - e Ivon, diplomaticamente, procurava explicar esta necessidade de rotatividade no palco - o público não sossegou. Só depois de "Luísa", em piano-solo, e "Chega de Saudade", com seu grupo, Tom saiu do palco. E depois do mito Tom, quem poderia entrar? Sérgio Ricardo, 58 anos, que não fez por menos! Ao lado de "Zelão", mandou farpas indiretamente ao jornalista Ruy Castro, autor do livro "Chega de Saudades" (que deixou SR furioso), e mostrou uma nova música, terrivelmente política e atual - "que não tem nada a ver com os puristas da Bossa", explicou Ruy, que sentado na primeira fila, elegantemente aplaudiu por três vezes a participação de Sérgio Ricardo - que aliás, promete um livro-resposta: "Quem Quebrou meu Violão" (já que tem uma editora acertada, a Europa), "para responder aquilo que Ruy não colocou em seu best-seller". Outro desafeto de Ruy, entraria em seguida: Caetano Veloso, chegando do show que havia feito no Circo Voador. Com o violão acústico, modulando sua voz tão bonita, Caetano foi terno ao relembrar um dos maiores sucessos de Lúcio: "Fim de Semana em Paquetá" (João de Barros / Alberto Ribeiro, 1947) ao lado de seu também intimista "Coração Vagabundo". Para um cantor que teve uma participação tão grande na época de ouro dos grupos vocais - especialmente Os Namorados da Lua - não poderiam faltar uma presença maior: Os Cariocas ali estavam, com "Águas de Março", "Sampa" e "Vou te Contar". E, se dependesse da vontade do público, ficariam até o fim da noite, mas Miele - nestas alturas substituindo a Ivon Curi na formação de mestre de cerimônias, com seu humor e irreverência, trazia Miltinho ao palco, satirizando seu estilo de intérprete sincopado com "Eu Quero um Samba" e "Mulher de 30". Mas foi para apresentar um rejuvenescido Cauby Peixoto - smoking branco, cabelo estilo permanente, mostrando uma juventude que é difícil acreditar para quem nasceu em fevereiro de 1935 - que Miele mostrou sua bossa de show-man. Reviveu histórias incríveis, antes que Cauby cantasse "Ligia" - que o público havia solicitado a Tom (mas que ele não atendeu). Depois de Cauby, chegou a vez de outro grande amigo de Lúcio, Billy Blanco, 64, autor de tantos sucessos, trazendo Sonia Delfino - esta, sem esconder a idade (longe, muito longe da garotinha ingênua nos anos 50), que fizeram "Teresa da Praia" - num dueto não convencional modificando a letra (afinal, Billy, como autor, tem este direito). Para encerrar, a grande bossanovista e jazzista Leny Andrade, às vésperas de seus 48 anos, esteve esplêndida, destacando os músicos que acompanharam vários artistas - baixista Lúcio Nascimento, baterista Adeão de Oliveira, e o idealizador Alberto Chimelli. Com toda sua bossa, conclamou os artistas que às 2h30 da manhã ainda estavam no Scala, para encerrar a noite com "Valsa de uma Cidade" (Antônio Maria / Ismael Neto). Não poderia ser uma escolha melhor. Ao assistir ontem a noite, o vídeo gravado, Lúcio chorou ao lado de sua companheira Marli. Mas sentiu-se com novas forças para enfrentar os problemas e voltar aos palcos. Cantemos por ele!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
20
20/12/1990

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