Login do usuário

Aramis

Uma noite de muita música para premiar os melhores

Elizeth Cardoso foi, merecidamente, aplaudida em pé. Por duas vezes, elas recebeu troféus em nome de dois premiados - o sambista Marçal (melhor disco na categoria) e Milton Nascimento (melhor cantor), que se encontram no Exterior: o primeiro acompanhando o espetáculo "Francisco" em Portugal. Milton excursionando pela Ásia, na maior excursão já feita por um artista da MPB no Exterior. Foi Elizeth, a Divina, quem também abriu, na segunda parte, o show cantando "Eu Não Existo Sem Você", primeira das 26 canções de Vinícius de Moraes escolhidas para homenageá-lo na noite de gala de entrega do I Sharp da Música Brasileira (Teatro D. Pedro I, Hotel Nacional, Rio de Janeiro, noite de terça-feira, 31 de maio). E, sem desmerecer nenhuma das estrelas de primeira intensidade reunidas na noite, Elizeth, em si, já seria a própria imagem da nossa melhor música, da homenagem prestada a Vinícius - especialmente por estar transcorrendo neste primeiro semestre, sem as efemérides merecidas, os 30 anos da gravação do álbum "Canção do Amor Demais", produção de Irineu Garcia, e marco real de toda a Bossa Nova. Fato que, infelizmente, não ocorreu ao roteirista do espetáculo, Ricardo Carvalho, mencionar no texto lido pelos atores Raul Cortez e Thales Pan Chacon. xxx José Maurício Machline, diretor do grupo Machline (Sharp/SID/Digibanco) foi muito feliz ao idealizar a realização de um grande evento musical para premiar a música brasileira. Estruturada em bases profissionais e independentes, com coordenação técnica entregue a uma respeitável empresa especializada de São Paulo - a Manduri 35, dirigida pelo executivo Mimito Gomes - a premiação transpõe a uma simples distinção de 66 nomes, dos vários gêneros de nossa música - do brega ao erudito - que pelos seus trabalhos gravados entre fevereiro/86-fevereiro 87, colocados no mercado, podem ser considerados os melhores. A produção fonográfica neste período ultrapassou mais de 5 mil títulos, considerando todos os lançamentos feitos - e deste total, ao menos 10% foi pré-classificado e inscrito para que um júri formado por 24 pessoas, com diferentes visões artísticas, fizesse as indicações que permitiram os resultados finais. A própria heterogeneidade do júri, que trabalhou livremente, ao longo de 120 dias, apreciando cada trabalho inscrito dentro de sua faixa específica permitiu chegar a um resultado equilibrado. Assim, houve possibilidades de serem reconhecidos talentos regionais - como os gaúchos Victor Hugo (agora com seu primeiro elepê, embora muitos anos de estrada) e Nery Lisboa (já partindo para o quarto disco), ou a cantora Yole (também de Porto Alegre, embora nascida na Espanha), que eram, para o eixo Rio-São Paulo, até agora, ilustres desconhecidos. Obviamente, em algumas categorias, deu o resultado óbvio mas, como um primeiro projeto de aferição crítica já se conseguiu um resultado expressivo, fugindo-se de uma ditadura imposta apenas pelo sucesso pré-fabricado ou interesses das gravadoras. Aliás, a independência da realização do projeto foi a pedra-de-toque de José Maurício Machline, preocupado em conferir a promoção que representou o investimento de aproximadamente US$ 600 mil, uma credibilidade que torne possível sua aproximação com o Grammy, o mais famoso e respeitado troféu da indústria fonográfica, completando neste ano três décadas de entrega regular nos Estados Unidos - nos últimos dois anos com a festa transmitida também para o Brasil, via televisão. xxx Gravada pela Rede Globo, para um especial a ser apresentado no dia 10, em rede nacional, a entrega do Prêmio Sharp da MPB foi, antes de tudo, uma festa de mulheres, lindas mulheres no palco do hotel Nacional, entregando os troféus aos premiados - com raras exceções, todos ali presentes, a maioria em black-tie, conforme exigia o convite. Houve atrasos, naturais, mas poucas gaffes que comprometessem a festa - embora a parte musical tivesse sofrido um problema de microfonia quando Edu Lobo, um dos parceiros de Vinícius, cantava o intimista "Canto Triste". Marina e Sandra Sá deram interpretações puxadas ao rock-funk para dois clássicos de Vinícius - "Garota de Ipanema" e "A Vida Sempre Tem Razão", suficientes para irritar aos mais conservadores e Caetano, respeitosamente, interpretou a modinha "Estrada Branca" - enquanto Djavan ficou com "Felicidade". O melhor, entretanto, esteve com os cantores, parceiros e intérpretes que conviveram mais com o poeta: Carlinhos Lyra buscando o coro do público para as três parcerias que com ele fez - "Minha Namorada" (Nara Leão, na platéia, fez falta neste momento no palco), "Marcha da 4ª Feira de Cinzas" e "Primavera"; Maria Creusa em "Eu Sei Que Vou Te Amar" e "Soneto da Felicidade" (com a gravação em voz de Vinícius); Marília Medalha em "Tomara" e "Se o Amor Pudesse"; Baden em "Berimbau". Em esfuziante traje vermelho, linda, Gal Costa, ao final, também referenciou a Vinícius, seu ídolo, com "Canção do Amanhecer", enquanto Emílio Santiago e Leny Andrade, em duo, trouxeram toda a vibração em "Tem Dó", "Tempo Feliz" e "Sabe Você". Toquinho, último parceiro de Vinícius - antes da projeção de algumas imagens em p&b lembrando o poeta rememorou toda uma fase de intensa parceria e trabalho ("Tarde em Itapoan", "Cotidiano" etc.). Raul Cortez e Pan Chacon abriram o espetáculo com a leitura, em diálogo, da crônica que Carlos Drummond de Andrade publicou em 9 de julho de 1980, no dia seguinte a morte do poeta, falando da chegada do Poeta ao Céu. LEGENDA FOTO - Elizeth Cardoso: mesmo não estando entre as premiadas, foi grande presença da noite da Sharp. Recebeu os troféus em nome de seus amigos Marçal (melhor disco de samba) e Milton Nascimento, melhor cantor - que se encontram no Exterior.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
03/06/1988

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br