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Aramis

Vampirismo no sangue dos latinos-americanos

É possível que hoje o filme nem mais esteja sendo exibido no Groff, onde deveria permanecer em exibição até amanhã. Afinal, nos dois primeiros dias de exibição 20 e 21), houve exatamente apenas 13 espectadores. Entretanto, << Até a Última Gota >> pode ser considerado como um dos mais importantes documentários do ano. Um longa-metragem incômodo, é bem verdade. Tanto é que teve problemas de liberação e sua participação em festivais internacionais irritou muita gente. No festival de Cannes, há 2 anos, este documentário de Sérgio Rezende era apenas um entre mais de 80 filmes apresentados no Mercado do Filme. Apresentado na tv francesa despertou a opinião pública e foi exibido duas vezes no mercado, conseguindo fato inédito: ser aplaudido em mostra que tem como objetivo a descoberta de filões comerciais. Bom documentarista - estreou com um curta sobre o joquei paranaense Rigoni, já tendo realizado um político filme de ficção (<< O Sonho Não Acabou >>, 1981), Rezende vai fundo nesta denúncia sobre a comercialização do sangue na América Latina, onde << o sangue e o suor são líquidos baratos e suas histórias se confundem>., como diz. O filme é amargo, chocante - e nem poderia ser diferente, tratando-se de um documentário que denucia a ação dos laboratórios multinacionais que adquirem o sangue colhido por << bancos >> em países da América do Sul - e que tem nas pessoas mais pobres muitas vezes doentes, a sua << matéria prima >>. O filme começa com imagens congeladas do ator José Dumont interpretando os 30 minutos finais da vida de Jucenil, que estava desempregado em 1974 e vinha vendendo sangue, para levar comida para casa. Em seguida, entrevista a mulher da vítima. A partir deste intróito, o filme apresenta um histórico completo sobre a mercantilização do sangue, que remota exatamente a II Guerra Mundial. Entrevistando << vendedores>., compradores, médicos e vítimas deste comércio - como um cidadão que contraiu hepatite devido a irresponsabilidade do médico (cujo nome é citado 3 vezes), o filme de Sérgio Rezende dá nome aos bois, denunciando corajosamente a questão, não apenas no Brasil, mas em outros países - especialmente o Haiti, onde a situação é ainda mais dramática. Fotografado por José Jofilly Filho, com música de Paul de Castro e narração de Hugo Carvana, << Até a Última Gota> é um filme-denuncia dos mais importantes, que mereceriam ser exibidos em todos os espaços possíveis - e não fica restrito, infelizmente, a apenas uma sala - na qual pouquíssimos espectadores se interessaram em assistí-lo.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
1
25/10/1983

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