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Aramis

As verdades de mr. Welles & sr. Sade

"A verdade é uma mentira" (Pablo Picasso) Seria exagero comparar "Verdades e Mentiras" a "Cidadão Kane", dizendo que entre os 34 anos que separam um filme de outro, Orson Welles, 65 anos, construir duas fitas definitivas. Mas é perfeitamente sustentável a tese de que se "Citizen Kane", produzido em 1939 e lançado em 1940, foi o filme mais revolucionário para a época, com sua linguagem e montagem, este "F For Fake" (Cinema 1, até domingo) é, nesta década, um filme de igual impacto - se considerar-mos os fatos que o cercam. De princípio, Welles, realizador bissexto, se propôs a questionar um tema de grande atualidade - a falsificação na obra de arte. Para isto associou-se ao documentarista François Reichembach e elegeu três personagens-tema: o falsificador de quadros Elmyr de Hory, o escritor Clifford Irving, autor de uma falsa autobiografia de Howard Hughes e a bela Oja Kodar, filha de um falsário húngaro. Da forma jornalística, Welles/Reichembach, auxiliado pelos fotógrafos Christian Odasso (na Europa) e Gary Graver (nos Estados Unidos) filmaram essas personalidades, em diferentes lugares e ocasiões, gravaram suas declarações. De posse deste material, mais cenas de arquivo, na sala de montagem, com apoio de Marie-Sophie Dubus e Dominique Engener, Welles mostrou toda sua genialidade de montador (em 1939, montando "Cidadão Kane", teve como assistentes Robert Wise e Mark Robson, que se tornariam, posteriormente grandes diretores). O resultado é um filme-documento que, particularmente, consideramos não só um dos 10 melhores lançamentos deste ano mas, sobretudo, uma obra-marco dentro de um gênero muito especial. "Verdades e Mentiras de Orson Welles" é um filme que deveria ser multiplicado em cópias de 16 mm/super 8, para ser exibido, constantemente, em todos os museus, galerias, escolas de belas artes, etc., como obra referencial sobre os conceitos de arte & falsificação. Aliás, essa nossa opinião é partilhada por Jorge Carlos Sade, pintor e marchand-de-tablaux ("Acaiaca"), que tem denunciado falcatruas no mundo das artes plásticas tupiniquins (Colection, falsificações de Di Cavalcanti, etc.) pois sabe quando se deve gritar e protestar. Assim "Verdades e Mentiras de Orson Welles" é atual, necessário e importante de ser visto (e revisto). Um filme que exige, entretanto, da parte do espectador uma razoável dose de informações sobre o mercado das artes plásticas e, especialmente, dos fatos ocorridos em princípios de 1972, quando o multimilionário Howard Hughes (1905-1976), processou Clifford Irving e sua esposa, a suíça Edith Irving, por terem vendido a uma editora uma falsa "autobiografia" que Hughes teria ditado a Irving. Welles parte, em seu filme, de informações já digeridas e, quem não esteja atualizado não compreenderá muitas das referências feitas ao longo de "F For Fake", um filme com muita narração e imagens rápidas, montadas quase num ritmo de audiovisual, com sucessivos "congelamentos" de imagens. Por partes, para ordenar os fatos focalizados: Elmir de Hory é considerado um dos maiores falsificadores de arte em todos os tempos, homem que enganou os "marchands" e diretores de museus por mais de 20 anos com as suas pinturas dos pós-impressionistas (Modigliane, Braue, Matisse, Dufy, Van Dongen, Picasso, Vlaminck) que deixaram perplexos os maiores peritos em arte moderna. Elmyr morou em muitos países, inclusive nos EUA. Refugiado hoje em Ibiza, uma ilha na costa da Espanha, após 8 anos de fugas, ali ele foi procurado pelo escritor Clifford Irving, que fez um livro a seu respeito. O mesmo Irving que, em 1972, seria processado e preso ao tentar editar uma "autobiografia" de Hughes um dos homens mais ricos do mundo, figura lendária do cinema e das altas finanças, que, nos últimos 20 anos de sua vida se recolheu a um total isolamento (para melhor entender esta personalidade fascinante, há 3 bons livros em [português]: "O Fantástico Mr. Hughes", 1972, de Noah Dietrich, 306 páginas, Bloch Editores; "Arquivo Secreto de Howard Hughes", de Laine Davenport/Paul Eddy, 251 páginas, 1975, Summus Editorial e "Hughes, a Face Oculta", de James Phelan, 188 páginas, 1976, Difel). Até onde Elmyr de Hory influenciou a Irving na idéia de fazer um falso livro sobre Hughes o filme não revela - embora faça insinuações a respeito de sua colaboração na falsificação da assinatura de Hughes, que peritos disseram autêntica. A Elmyr e Irving, Welles acrescenta uma terceira personagem: a bela húngara Oja Kadar, que fascinou Pablo Picasso (1881-1973), que dela fez 22 retratos. Ao saber que os quadros estavam sendo apresentados em Paris, Pablo, [furioso] pretendia interditar a mostra, quando teve uma surpresa: os quadros expostos, a ele atribuídos, eram outros, falsificados pelo pai de Oja (no filme aparece como avô, no leito de morte). Welles se coloca também como um farsante: desde os 16 anos, como ator, na Irlanda, mentindo, até o grande susto que deu através de Mercury Theatre In The Air, numa transmissão radiofônica realista de "A Guerra dos Mundos", de H. G. Wells (1866-1946), que a 30 de outubro de 1938 - portanto há quarenta anos - provocando pânico em mihões de americanos. E, naturalmente, Welles ainda faz citações de seu filme mais famoso, "Cidadão Kane", inspirado na figura do magnata da imprensa americana, Randolph W. Hearst (1863-1951). Com extrema genialidade, bom humor e ritmo, muitas vezes numa linguagem coloquial, a vontade, falando de homens-mitos de nosso século, como Picasso e Ernest Hemingway (1898-1961), com a intimidade de quem com eles conviveu, Welles vai oferecendo ao espectador uma série de dados e sugestões estimulantes ao raciocínio. Um texto perfeito, poético (como na [seqüência] em que fala sobre a Catedral de Chartres, na França), mas sempre questionando o que é, o falso e o verdadeiro - a mentira e o real. Assim, "F For Fake", tem um tom mágico (aliás, Welles aparece na primeira [seqüência] fazendo mágicas frente a uma criança), sem, em nenhum momento pretender dar respostas definitivas. Ao contrário, o tom de dúvida e um certo mistério permanece nos 96 minutos de projeção. "Verdades e Mentiras" não se esgota, simplesmente, nas imagens que projeta - mas assume uma grande atualidade. Afinal, há apenas 6 anos, um espertalhão italiano, Paulo Businco, conseguiu se tornar o "czar" dos artistas plásticas brasileiras com o falso nome de José Paulo Dominguez da Silva (1918-1975?), através da galeria Collection - que terminou em escândalo nacional, com alguns aspectos até hoje não esclarecidos oficialmente e que envolveram muitos nomes conhecidos (fala-se, inclusive, que Businco/Dominguez não morreu de enfarte, como foi noticiado e estaria no exterior). Dominguez era, segundo garante Sade - um dos primeiros a denunciar suas atividades - amigo de Fernand Legros, falsário (preso hoje na França) e uma das "conexões" de Elmyr, que chegou a ser detido no Rio de Janeiro. Numa das cenas de "Verdades e Mentiras", Welles fala que há dois falsos quadros atribuídos a tintoreto (1518-1594) no Brasil. Na opinião de Jorge Carlos Sade, um deles é o que pertence ao Museu de Arte de São Paulo. O mesmo Sade denunciou, há dois anos, a falsificação de telas de Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976), ao se surpreender com o quadro, atribuído a Cavalcanti, no apartamento de um novo rico curitibano (88que por ele pagou quase Cr$ 100 mil). Sade enfrentou novas brigas mas no fim provou que tinha razão: o quadro era realmente falsificado. Assim, as questões que em nível local podem ser apontadas e lembradas, mostram que aquilo que Welles propõe discutir em seu "Verdades e Mentiras" não estão distantes. Ao contrário, são atualíssimas colocações: qual a importância da crítica de artes plásticas, dos expertises (não custa lembrar, diz ainda Sade, que o crítico José Roberto Teixeira Leite forneceu várias autentificações em quadros falsos de Di Cavalcanti), de um mercado de artes plásticas falso, corrupto & corruptor? Numa época em que o dito boom das artes plásticas provoca, até em escala tupiniquim, mistificações e falsidades, com galerias-arapucas, falsos talentos e, nos últimos tempos, dondocas deslumbradas da sociedade, em busca de falso status cultural, usando a vaidade dos profissionais de amenidades sociais fazendo, enfim, do campo artístico um negócio tão sujo e malcheiroso quanto um mercado de beira de porto, a visão de um filme como "F For Fake" adquire uma oportunidade única. Por tudo isto é que achamos que "Verdades e Mentiras de Orsom Welles" não deveria ser exibido apenas uma semana num cinema de arte, restrito a um pequeno público.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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13/10/1978
estive com uma vendedora de cristian laine e por força maior tive que me mudar ,agora tenho produto do mesmo para enviar e nao tenho direçao do responsavel .pesso por favor que me passe o contacto para que possa enviar os pedidos URGENTE. obrigada pela atençao .

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