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Edifício Vinícius de Moraes a homenagem que soa ao comercial

Toquinho (Antônio Pecci Filho), por mais de 11 anos o fiel amigo e parceiro do eterno Vinícius de Moraes, surpreendeu-se na semana passada ao receber o material promocional do Edifício Vinícius de Moraes em construção no bairro da Boa Vista. Embora tenha gostado da qualidade que o ator Maurício Távora deu na interpretação dos sonetos da Separação, do Amor Total, da Fidelidade e do Maior Amor – ao som do perfeito violão de Sebastião Tapajós, a exploração da obra, do nome e da imagem do poeta em torno de um edifício deixou o bom Toquinho perplexo. Telefonou a familiares de Vinícius, inclusive à sua última esposa, Gilda Matoso – agora executiva da área de relações públicas da Ariola, indagando se havia sido feita alguma consulta prévia, pedindo autorização para o uso do nome e da obra de Vinícius neste lançamento comercial e a resposta foi negativa. Assim, apesar da Facenorte Construções Civis, pertencente ao engenheiro Luis Fernando Camargo, lhe ter feito uma proposta para que gravasse um comercial “vendendo” o edifício, Toquinho está relutando em aceitar convite. Afinal, teria sido muito mais elegante aos incorporadores do prédio fazer uma consulta prévia aos familiares de Vinícius, pedindo autorização para usar o seu nome, sua obra e inclusive a sua imagem num empreendimento que, em última instância, visa exclusivamente lucros pessoais.   xxx   Toquinho foi quem, tão logo começou a trabalhar com Vinícius, em 1969, começou a se preocupar em organizar os direitos autorais do poeta. Afinal, Vinícius – homem essencialmente criador, não se preocupava com os seus direitos autorais [,] mas com a conscientização de toda classe dos compositores em defenderem melhor seus direitos, o poeta incorporou-se ao movimento. Assim, não por razões mercantilistas – mas por uma simples questão de consciência profissional, Toquinho vê, com toda razão, a necessidade de que a obra e imagens de artistas e criadores tenham uma maior valorização, evitando-se que empresas comerciais busquem em supostas “homenagens” apenas a exploração de talentos que tanto deram para música e a cultura brasileira. Evidentemente, a Facenorte Construções deve ter suas razões para a “homenagem” que prestou a Vinícius de Moraes – inclusive com precauções jurídicas. Mas teria sido mais simpático e oportuno um prévio trabalho de relações públicas, consultando seus legítimos herdeiros e amigos, que por certo não se recusariam a colaborar. Agora, quer contratar Toquinho para que se torne “garoto-propaganda” – em comerciais de rádio e televisão – para vendas das unidades do imóvel. É de se perguntar, se há alguns anos, os diretores desta (ou de outra empresa) se disporiam a ajudar na promoção de uma temporada de Vinícius e Toquinho, quando eles vinham a Curitiba e não encontravam apoio de nenhum empresário para promover seus espetáculos.   xxx   No Momento em que a defesa dos direitos autorais começa cada vez mais ampliada, é de se perguntar também até onde que os incorporadores de edifícios têm o direito de utilizar nomes de escritores, poetas, artistas plásticos etc.; falecidos há mais de 60 anos, em suas corporações? Se os direitos caducam no 60º ano da morte do autor, durante seis décadas a sua obra – e por conseguinte a sua imagem – tem proteção legal. Escolher simplesmente nomes de pessoas famosas para “promover” edifícios, é uma jogada de marketing que merece questionamento Vinícius de Moraes, há mais de dois anos foi construído o edifício Noel Rosa. Apesar da exploração que o incorporador fez do nome do Poeta da Vila , não teve sequer a sensibilidade de convidar um grupo musical para fazer um show com as músicas de Noel, na inauguração do prédio. Ou ali ficar uma placa decente, com os mínimos dados sobre a vida do autor de “ Onde está a honestidade?”   xxx   Na generosidade que caracteriza Toquinho – e também os herdeiros de Vinícius de Moraes – é possível que não haja nenhuma providência legal contra o uso do nome do Poeta neste empreendimento comercial. O próprio Toquinho, pessoa das mais ternas e que tem grandes amigos em Curitiba, sentiu-se constrangido em dar uma negativa formal ao convite mal formulado, mas a forma com que a proposta foi conduzida, especialmente lhe dando o fato consumado, o deixaram aborrecido. Seria interessante que os incorporadores de prédios que exploram os nomes de poetas, músicos, escritores e artistas plásticos nas fachadas de seus edifícios – à gusa de discutíveis “homenagens”, reservassem parte dos altíssimos lucros que obtêm para auxiliar as atividades culturais. Afinal, há muita gente precisando do apoio e estímulo e como diz o grande Nelson Cavaquinho “se alguém quiser fazer alguma coisa por mim/ que faça agora”. Depois de morto, placas nada adiantam!             (a não ser como marketing comercial dos tubarões imobiliários).
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
9
17/01/1982

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