"Ain't Misbehavin", um espetáculo para sempre
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 04 de junho de 1988
"Ain't Misbehavin", musical baseado em composições e interpretações de Thomas "Fats" Waller (1904-1943), em concepção de direção original de Richard Maltoy Jr., dez anos após sua estréia em Nova Iorque, encerrou, na quinta-feira, 2, sua temporada latino-americana. Sexta-feira à noite, Gaby Leib, a super-empresária responsável pelo êxito desta temporada para cinco capitais brasileiras (Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Curitiba), ao se despedir de Paul Michael Armstrong, diretor de produção, não escondia sua alegria. Apesar do custo de mais de US$ 7 mil por apresentação, a temporada deu lucro e animou a Gaby a já iniciar os contatos para trazer em abril de 1989, um novo musical que, há 6 anos passados, foi um dos grandes êxitos na Broadway: "Dancin", criado e dirigido por Bob Fosse (1927-1987), um dos mais conhecidos diretores de musicais americanos, tanto em teatro como no cinema ("Cabaret", "That's All Jazz" etc.).
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Mesmo com a baixa de um dos cantores - Frank Alexander Farrow III, que devido a problemas de saúde permaneceu no Rio, a única apresentação de "Ain't Misbehavin" entusiasmou ao público curitibano, que, pela primeira vez, viu em nossa cidade um musical da Broadway, conforme a concepção original. Evidentemente que o próprio elenco reduzido, mas quem, desde maio de 1977, em suas viagens a Nova Iorque ou Londres, aplaudiu este espetáculo, não escondia seu entusiasmo: a montagem aqui apresentada conserva a mesma dignidade e competência original. Para tanto, consta o excelente nível dos cantores e instrumentistas e, sobretudo, um repertório com alguns dos mais belos momentos da canção americana, que o Gênio do gordo, irrequieto e boêmio Fats Waller criou entre 1925 ("Squeeze Me") até poucos meses antes de sua morte ("The Ladies Who Sing With The Band", 1943).
Mesmo os espectadores sentados nas três primeiras filas do auditório tiveram dificuldades de ver os micro-microfones usados pelos cinco cantores no palco. Aparelhos tão sofisticados e perfeitos, camuflados nos trajes, que ampliavam para todo o auditório Bento Munhoz da Rocha Neto - cuja acústica, sabidamente, não é das melhores - a perfeição das letras cantadas.
John Edward McCallum, no piano (e vocalizando apenas o tema "Find Out What They Like", 1929), Charles Butler no contrabaixo acústico e Rudolph Alexander Collins na bateria-percussão formaram a base notável para toda a sonoridade das 26 canções de Fats Waller selecionadas por Richard Maltoy Jr.
Da abertura com "Ain't Misbehavin" (1929) ao encerramento com a reprise de "Honeysyckle Rose" (também de 1929) - os dois standards mais conhecidos da obra de Fats Waller, foi um desfilar de momentos bem humorados, criativos e, sobretudo, harmônicos da melhor canção americana com a espontaneidade das três cantoras - e engraçada Terri Gayle White, Bansillia Lewis e especialmente a sensual Julia Lema Jackson, mais o gordo e perfeito Arthur Myles McMillan, o "Fats". Julia, uma beleza e elegância marcante (houve quem a comparasse a Sonia Braga) especialmente emotiva ao cantar, quase a capela, "Keepin Out Of Mischief Now" (1932), enquanto Terri Gayle deu a "Meam To Me" (1929) uma dimensão maior. Mas o público delirou quando o quarteto, numa harmonia extraordinária, fez "Black and Blue" (1929) adquirir uma extensão quase espiritual - especialmente por se seguir ao deliciosamente alegre e irreverente "Fat and Greasy" (1936), que Arthur McMillan conseguiu entusiasmar tanto, fazendo o público participar, ao menos na percussão das palmas.
"Ain't Misbehavin", um momento musical especial dentro da história dos melhores eventos musicais já realizados no Guaíra. E como tudo que é melhor foi apenas uma noite para se lembrar sempre.
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