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Aramis

Os Cariocas, tão maravilhosos hoje como há 40 anos passados

Quando se fala em conjuntos vocais no Brasil, há uma unanimidade entre os que conhecem o mínimo de MPB: nunca houve um melhor do que Os Cariocas. Ao longo de 21 anos (!946-1967), o grupo fundado pelos irmãos Ismael Neto (Ismael de Araújo Silva Neto, Belém do Pará, 1925 - Rio de Janeiro, 1956) e Severino Filho (Severino de Araújo Silva Filho, Belém, 1928) foram únicos. Nas duas décadas de sua primeira fase - no qual sofreram algumas mudanças, surgiram dezenas de outros grupos vocais - trios, quartetos, quintetos, com estilos diferentes, alguns de grande popularidade, a música brasileira atravessou diferentes fases, mas Os Cariocas foram únicos, perfeitos, inimitáveis e insubstituíveis. Tanto que quando o grupo se separou, em 1967, criou-se um vazio que não teve substitutos. E que fez com que, após 11 anos, quando, finalmente, o grupo voltou a atuar, se tornasse um evento do maior significado para a música e cultura brasileira. Os cariocas separaram-se no auge de sua fama, quando, dentro da Bossa Nova - da qual foram precursores, com suas modernas harmonizações, repertório requintado, constante pesquisa de vozes - foram do grupo de fundadores, como, aliás, exaustivamente, o jornalista Ruy Castro em seu básico "Chega de Saudade" (Companhia das Letras, 1990) soube reconhecer e contar em detalhes. Infelizmente, nem bem Os Cariocas retornavam com sua formação original dos últimos anos - Líder Severino, Quarters, Badesco e Luís Roberto, este último, cardíaco, na emoção de um show no Jazzmania, na noite de 20 de outubro de 1988, aos 48 anos, morria nos bastidores de um show. O choque foi brutal e poderia significar o fim da tentativa do retorno dos Cariocas, mas felizmente um grande amigo do grupo, também excelente cantor, Edson Bastos (RJ, 1941), aceitou participar do grupo e como já conhecia o estilo, ajustou-se perfeitamente. E Os Cariocas, há 4 anos, vem fazendo shows pelo Brasil e, o que é importante gravando discos. Após um elepê, ainda com Luís Roberto, na Sigla, finalmente foram contratados pela WEA, que em "Reconquistar", com participações especiais e efetivas, realizou a produção (lançada em CD, fita e vinil) que, em nossa opinião, é o melhor disco do ano, em termos de grupos vocais e um marco artístico. O título é que pode ser discutível: "Reconquistar", da faixa de Ivan Lins e Vitor Martins. Apesar da beleza da música, Os Cariocas não precisam reconquistar nada: o espaço que possuem na MPB nunca foi preenchido e hoje, como nos anos 40, 50 e 60, são perfeitos. A admiração que o grupo merece é tão grande que houve participações espontâneas e especiais dos autores de quatro faixas: Caetano Veloso em "Sampa"; Guilherme Arantes, piano e voz em "Vôo (São Conrado)"; Ivan Lins em "Reconquistar"; João Bosco, no violão e voz em "Terra Dourada"; Tom, novamente no vocal em "Bebol" além dos percussionistas Bernardo Carvalho Bittencourt e Barney. As outras faixas são "Luiza" (fom), "Amei Demais" (Cláudio Cartier/Marco Aurélio); "O Sol Nascerá" (A Sorrir) (Cartola/Elton Medeiros); "Capim" (Djavan); "Tarde em Itapoã" (Vinícius/Toquinho); "Travessia" (Milton/Fernando Brandt); "Pretaporte de Tafetá" (Bosco/Blanc) e "Vagamente"(versão para o inglês, de "Vagamente", de Menescal/Ronaldo Boscoli). Dispensável, totalmente, qualquer comentário sobre este repertório. Também redundância enaltecer os arranjos, a vocalização, a perfeição das vozes e, especialmente, a modernidade que estes sessentões - exceto Edson Bastos - trazem, com vigor dos anos de ouro para um repertório classe. Em suma, é daqueles discos para serem adquiridos rapidamente, guardados com carinho - por representar uma mostra que ainda, felizmente, de quando, há momentos da maior dignidade do nosso melhor músico popular.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
4
05/07/1992

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