Login do usuário

Aramis

A grande música dos saxofonistas

Quando, há 141 anos o instrumentista e artesão Antoine Joseph ("Adolph") Sax (Dinant, 1814 - Paris, 1894) desenvolveu um instrumento de metal, com tubo cônico e com a forma aproximada de um cachimbo, não imaginaria que estava dando uma das maiores contribuições à música. O saxofone seria um instrumento dos mais perfeitos que se conhece: mundo de um mecanismo de chaves (semelhante ao do oboé), seu timbre é suave e aveludado; rapidamente, tornou-se popular sendo empregado nas bandas, aceito mais tarde nas orquestras e tornando-se especialmente popular neste século, como um dos instrumentos mais melódicos da formação jazzística. A família do saxofone compreende seis instrumentos - embora três sejam os mais conhecidos e utilizados: o sopraninho em mi bemol; o soprano em si bemol; o alto em mi bemol; o tenor em si bemol (o mais usado), o barítono em mi bemol e o baixo em si bemol. A extensão de qualquer um deles varia de acordo com a natureza do instrumento. Tanto na fase das big bands como em pequenas formações instrumentais a partir dos anos 30, o jazz integrou-se de uma forma notável como instrumento básico de improvisação e harmonia. Assim, há algumas dezenas de virtuoses que tiveram no sax tenor e sax alto, a sua grande forma de criação musical. Dos recentes lançamentos de jazz feitos no Brasil, 5 álbuns trazem saxofonistas esplêndidos, em contribuições esplêndidas para mostrar a força e beleza deste instrumento de difícil execução e que, em nosso País oferece aos que por ele se interessam a falta de bons mestres (com exceção de poucos virtuoses no eixo Rio-São Paulo, praticamente inexistem saxofonistas com capacidade didática nos Estados). STAN GETZ (Philadelphia, 2/2/1927) talvez seja um dos instrumentistas americanos mais populares no Brasil. Seu nome estará sempre associado a difusão da Bossa Nova nos Estados Unidos no início dos anos 60, com suas históricas gravações com João Gilberto e Astrud e o êxito ainda insuperável de "The Girl From Ipanema". Entretanto, muito antes da eclosão da BN - que Getz a exemplo de outros Jazzistas (Herbie Mann, Charlie Byrd etc.), percebeu - já era um nome respeitado por seu domínio ao sax-tenor, com um estilo personalíssimo e que coerentemente manteve em todas as suas gravações. Após trabalhar 5 anos com a orquestra de Woody Herman, formou seu próprio quarteto, com o qual fez inúmeras gravações de sucesso. Na série "The Verve Years", a Polygram lançou no final de 1984 um álbum duplo fundamental para se conhecer um dos melhores períodos da criatividade de Getz: "The Chick Corea/Bill Evans Sessions - Stan Getz", reunindo sessões feitas em 1964 e 1967, com a participação de instrumentistas dos mais notáveis. Assim, de sessões ocorridas no outono de 1964 em Nova Iorque temos o sax de Getz em perfeito casamento com o piano de Bill Evans (1929-1979), o baixo de Ron Carter e a bateria de Elvin Jonnes em standards como "Night and Day" (Cole Porter), "My Heart Stood Still" (Rodgers/Hart), "Melinda" (Lerner/Lane), "Grand-fathers Waltz" (Farniof), "Funkallero" (Evans) e "But Beatiful" (Burke/Van Heusen). Gravado três anos depois, ainda em Nova Iorque, uma nova sessão reuniu Getz a outro pianista extraordinário - Chick Corea, ao mesmo baixista Carter mas já com o baterista Jones substituído por Grady Tate, numa seleção em que já se sentia uma maior influência da Bossa Nova, com uma das faixas reservadas a "O Grande Amor" (Jobim/Vinícius), ocupando quase cinco minutos. "Litha", "Sweet Rain" e "Windows" de Chick Corea e o eterno "Con Alma" (Gillespie) complementaram o repertório desta extraordinária sessão. Um jazz suave, profundo e extremamente agradável, que fazem deste álbum duplo um dos melhores discos da básica "Verve Years" que, tão caprichosamente, a Polygram tem editado no Brasil. Sonny Rollins (Theodore Walter Rollins, Nova Iorque, 7/9/1929) é outro lendário saxofonista - além de incrível compositor. Em 1957 já era escolhido o melhor instrumentista (Sax-alto) pela "Down Beat", cujo jazz poll frequentou com freqüência - praticamente somente não aparecendo em seus dois longos (e voluntários) exílios, nos quais, por razões extremamente pessoais, retirou-se para meditações místicas, indo estudar ioga, Zen e as teorias de Ghita no Japão e na índia, em 1968/71. Anteriormente, já havia feito um outro retiro, do qual saiu com a gravação de um dos mais notáveis álbuns da história do jazz moderno ("The Bridge", editado no Brasil pela RCA em 1964 mas hoje raríssimo). E influência de Rollins sobre o jazz moderno é fundamental e um de seus mais interessantes álbuns ("Tour de Force", Prestiger) foi finalmente lançado no Brasil, no ano passado, pela Barclay em seu esplêndido pacote de discos jazzísticos. Neste álbum sente-se bem o clima dos anos 50, época em que Rollins havia trabalhado com instrumentistas da dimensão de Charlie Parker, Coleman Hawkins e Ben Webster, cujas influências sempre admitiu. Unindo-se a um extraordinário pianista, Kenny Drew (que chegou a fazer alguns discos com Bossa Nova), ao baixista George Morrow e o baterista Max Roach, além de trazer um vocalista em dois dos cinco temas - Earl Coleman dizendo as letras de B. Quick em "Two Diferents Worlds" e "My Ideal" é um disco otimista, com a profundidade que sempre caracterizou a Rollins - cujos solos nos levam a longos mergulhos sonoros - como, por exemplo em "B. Quick" faixa de quase dez minutos de duração e que possibilitam a formação de extraordinários desenhos melódicos. Um disco de intensa reflexão este "Tour de Force" - título dos mais apropriados para um trabalho de intensa perfeição. JIMMY (James Robert) FORREST (Saint Louis, 24/1/1920) apesar de ser um veterano sax-tenorista é infelizmente pouco conhecido. Chegou a integrar a orquestra de Duke Ellington entre 1949/50, fez seus próprios discos e, nos anos 70 ter trabalhado com Count Basie, seu trabalho solo é praticamente inédito no Brasil. Por isto, mais uma vez os jazzófilos devem muito a Barclay em trazer este "Out of the Forrest" (Prestige), gravado em 18 de abril de 1961, com a participação de um moderno tecladista - Joe Zawinul (integrante do Weather Reporter) e mais dois outros extraordinários músicos - o baixista Tommy Potter e o baterista Clerence Johnston. Um repertório eclético, no qual ao lado de temas conhecidos como "That's All" (Haymes/Brandt), "Yesterdays" (Harbach/Kern), "By the River St. Marie" (Leslie/Warren) e "This Can't Be Love" (Rodgers/Hart), temos também as composições de Jimmy Forrest, como "Bold Blues" e "Crash Program". Outro saxofonista de excelente nível de criatividade mas também pouco conhecido entre nós é BREW MOORE (Milton Aubrey Moore, Indianola, Mississipi, 26/3/1924 - Copenhague, 19/8/1973). Seus longos períodos de atividades na Europa (entre 1965/67 residiu em Copenhague), e mais tarde, fixando-se por alguns anos nas Ilhas Canárias, fizeram com que suas gravações se tornassem espaçadas - sem que com isto deixassem de ter a maior importância. Leonard Feather, o papa do jazz, ensina que influenciado por Lester Young, Moore incorporou ao seu estilo inovações introduzidas no jazz por Charlie Parker mas sem abandonar a sua linha básica de interpretação. Podemos sentir isto neste raro e fundamental "The Brew Moore Quartet and Quintet" (Fantasy/Barclay), gravado no Marines Memorial Hall, em 15 de janeiro e 2 fevereiro de 1956. Trabalhando com John Marabuto, o baixista Max Harstein, o pistonista Dick Mills e o baterista Gus Gustofson (como se vê, todos instrumentistas pouquíssimo conhecidos), Brew Moore impressiona pela sonoridade nas composições - três delas de Marabuto ("Them Old Blues", "Rose" e "Five Plants In Leo") e dando novas leituras quando revisita hits como "Tea For Two" (Youmans), "Food Rush In" e, especialmente a "I Can't Believe That You're in Love With Me". JACKIE (John Lenwood) McLEAN (Nova Iorque, 17/5/1932) além de saxofonista, é flautista, compositor e professor. Trabalhou com Charlie Mingus e Art Blakey e fez uma peça de sucesso na Off-Broadway ("The Connection", posteriormente levada ao cinema), e nos últimos 15 anos tem dividido sua carreira entre algumas apresentações ao vivo, (poucas) gravações e uma intensa atividade didática. Com isto também não figura entre os instrumentistas mais populares, o que não reduz seus incríveis méritos como mostra nas seis faixas deste "McLean's Scene" (Prestige), gravado em 1959, com Bill Hardman (pistão em "Gone With the Wind" e "McLean's Scene"), Max Waldron ao piano (exceto nestas duas faixas, substituídos por Red Garland), Paul Chambers/Arthur Philips (baixo) e Arthur Taylor (bateria). Trabalhando sobre material exaustivamente conhecido - como "Gone With the Wind" ou "Our Love Is Here to Say". McLean dá aquela interpretação sofrida e bela que só os mestres sabem conseguir - o que especialmente na sua própria colagem ("McLean's Scene") atinge um momento de imensa ternura - fazendo com que se escute inúmeras vezes este belíssimo álbum - sempre com uma nova e maior profundidade.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
19
03/02/1985

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br